segunda-feira, 15 de março de 2021

ENTREVISTA DA SEMANA! Deninho Gari de Pirpirituba

Nome: Deninho Gari

Trabalha como Gari na Prefeitura Municipal de Pirpirituba-PB

Formado em História UEPB

Participou dos programas Encontro e The whall da Rede Globo


Hobby! Gosto muito de fazer poesias, assistir filmes, principalmente filmes que tenham contexto histórico, medieval.

O Gari tem um trabalho difícil por motivo de saúde e higienização, há quanto tempo você é Gari?

Eu exerço a função de Gari há mais de 10 anos, comecei em 2011, então já são mais de 10 anos exercendo essa função.



Quais os cuidados que um Gari deve ter quando está realizando o seu trabalho, existe algum cuidado específico?

Sim, o Gari, principalmente o da coleta, tem que ter bastante atenção no seu trabalho, um trabalho que tem que ser rápido, ágil. Porém ele tem  que ter uma noção de quando pegar na sacola, para evitar de se cortar com algum material perfurocortante, então todo cuidado é pouco.

Você já sofreu algum tipo de discriminação por ser Gari?

Quando você exerce uma função tida como de menor prestígio social, como é o caso da profissão de Gari, há sempre algums olhares negativos, porque você trabalha diretamente com o lixo, então isso carrega aquela imagem negativa, ainda aquele preconceito, é uma função que históricamente por pessoas mais velhas que não tiveram oportunidade de estudo. Então hoje, jovens ocupando cargos como este, chamam atenção, e ao mesmo tempo eles sofrem a questão da indiferença também, eu não me lembro de um preconceito propriamente dito, mas o olhar das pessoas em relação à você, quando você passa varrendo, coletando, o olhar das pessoas lhe marcam, é um olhar muitas vezes de pena, pode ser de desprezo, admiração. Então, tudo isso está exposto no olhar das pessoas, e quando a gente exerce funções como essa, há sempre essa questão preconceituosa, negativa.

Formado em História, você é referência de esforço e dedicação, como foi o caminho para  se formar?

Sempre foi um desejo meu, ingressar no ensino superior, para tentar mudar minha realidade através da educação. Nós que viemos de uma família humilde, meus pais nunca tiveram condições de pagar um cursinho, universidade.

A gente tem que realmente ralar, buscar através de nossos esforços conseguir chegar lá. Então não foi uma tarefa tão fácil, tentei ingressar no ensino superior em 2006, quando conclui o ensino médio, e eu não consegui, então comecei a prestar concursos, e depois que passei para a profissão de Gari, e sentindo os efeitos dos impactos da vida como ela é, através do exercício dessa função, as dificuldades pelas quais a gente está exposto trabalhando como Gari, à partir dai tentei fazer alguma coisa que pudesse mudar a minha realidade, o caminho foi a educação, ingressei no ensino superior no ano de 2014, e as dificuldades não acabaram por ai, pelo contrário, ficaram ainda mais difícil, ter que conciliar o trabalho nas ruas com o estudo na universidade foi uma tarefa difícil, também sou pai de família, conciliar com a família. Mas as dificuldades encontradas pelo caminho me fizeram não desistir, cada um de nós tem um propósito de vida, de melhoria continua, e eu tinha que passar por esses obstáculos para me sentir mais forte e alcançar meus objetivos, minhas metas. Então, com muita dificuldade consegui o diploma de graduado em História pela Universidade Estadual da Paraíba, então não foi uma tarefa tão fácil, mas com esforço, foco, determinação, dedicação, a gente consegue realizar sonhos no qual aos olhos seriam impossiveis, mas onde se tem força e perseverança, a gente consegue chegar lá.




A visita à Rede Globo, aos programas “Encontro” e o “The wall”, com certeza foi gratificante e marcante para sua história. Como descobriram você? Você gostou da participação e dos bastidores?

Tudo começou na Universidade Estadual da Paraíba, onde no final do curso, temos que apresentar o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso). Então eu escolhi uma temática, que é a invisibilidade dos agentes de limpeza pública, os Garis. Eu escolhi falar sobre a minha função e mostrar que somos todos invisiveis exercendo ela, entrevistei vários Garis, e no dia da apresentação do meu TCC, 11 de Junho de 2019, eu resolvi levar a minha farda e apresentar o trabalho com ela, eu falava de invisibilidade, eu sou Gari, então eu queria chamar a atenção da sociedade em relação à essas questões, esse problema tão sério, que nem a Universidade, de fato ainad discute com uma proporção grande, no qual esse tema merece. Depois dessa apresentação, eu não achava que iria ter tanta repercussão, mas a imagem de um Gari, vestido de Gari, com trabalho de conclusão de curso, chamou atenção de todo Brasil.

Essas imagens daquele dia viralizaram na internet, e consequentemente, vários veículos de comunicação, Rádio, TV, vieram ao meu encontro, querendo saber mais sobre a história do Deninho Gari, e cheguei até a Globo, a produção do programa “Encontro” entrou em contato comigo, me levaram até lá, mostrei um pouco do meu TCC lá, falamos um pouco da invisibilidade. Isso foi marcante, muito marcante na minha história, ter participado do Encontro com Fátima Bernardes, que me fez abrir os olhos e enxergar ainda mais a minha função, e a importância de levantar bandeiras na valorização dos Garis.

Depois dessa repercussão, eu comecei a abrir os olhos e enxergar também os catadores de materiais recicláveis, mostrar a importância que têm essas pessoas, e de mostrar a importância da separação do lixo, evitando acidentes com Garis e catadores, e também concientizando a população no descarte, na separação correta. Consequentemente isso iria gerar renda para os catadores, e diminuir os resíduos levados para os lixões e aterros, e assim os impactos ambientais.

Esse trabalho contínuo que eu já vinha fazendo há mais de ano, chamou atenção também do Caldeirão do Huck, pessoal entrou em contato comigo para saber da minha história, contei o trabalho que vinha desenvolvendo com os catadores, e tive que passar por um processo, várias etapas, até chegar na última etapa e ser escolhido, em meio a milhões de histórias, foram escolhidas 24 histórias na 4° temporada do The wall, então participei do programa, isso foi motivo de alegria e satisfação, ver a minha história sendo realmente, novamente contada pela segunda vez, e levando comigo não apenas os Garis, mas chamando atenção do Brasil em relação à questões sobre o meio ambiente, sobre a valorização dos catadores, e sobre a reciclagem.  Então, isso foi um motivo de orgulho, ter posibilitado fazer isso, levar minha história, e levar comigo pessoas que são de extrema importância para o nosso mundo.

Você é autor de um projeto, como funciona esse projeto, e qual a maneira de ajudar?

O projeto é “Adote um catador”. Consite em fazer com que as famílias, os moradores, comecem a fazer a separação correta em suas casas, do que é o lixo seco, lixo molhado. O lixo seco é aquilo que pode ser reciclado e reaproveitado, e o lixo molhado é aquilo que não serve para reciclagem, que é o orgânico, que também tem sua utilidade na questão da compostagem, e na questão de alimentar os animais, e o lixo considerado rejeito. Então, o projeto tem esse objetivo, da população começar a fazer isso e depois desse processo de aprendizado, adotar um catador(a), criar um vínculo com essa pessoa, e separar continuamente em sua casa, por 5 ou 10 dias, esse material, e ligar para um catador(a) ir na sua residência coletar o material que pode ser reciclado. Então é uma coisa muito simples, criar esse  vínculo com um catador.

Muitas pessoas dizem “Mas eu não conheço nenhum catador, Deninho, como eu faço?”. Esse projeto tem como objetivo conscientizar as pessoas, então se você começar a separar em sua casa, coloque na frente de sua casa, consequentemente alguma pessoa vai pegar, e se na sua cidade ja tiver implatanda a coleta seletiva, melhor ainda, vai ter o dia certo para a coleta seletiva passar e coletar esse material. Então é uma questão de consciencia, de conscientização, o morador fazendo a sua parte, o catador fazendo a dele, junts por um objetivo maior, que beneficie o meio ambiente, gere renda para os catadores, esse é o “Adote um catador”.

Você acredita que os Garis deveriam ser mais valorizados?

A valoriação da nossa categoria é de extrema importância, a valorização social é muito importante, a população nos ver com bons olhos, empatia, nos dar bom dia, isso é de extrema importância. Mas também tem a questão da valorização econômica que é um ponto chave para o reconhecimento da nossa categoria. Existem prefeituras que não pagam um salário digno, não pagam insalubridade, não dão aos trabalhadores, condições para que eles possam excercer o trabalho de forma digna e com segurança, também um piso salarial, que há mais de 11 anos está em tramitação, um piso salarial que iria dar esse reconhecimento econômico à nossa classe. Já há muitas categorias que conseguiram através de muita luta, essa valorização econômica, e a gente não é diferente, estamos lá na chuva, no sol, de noite, madrugada, enfim. A realidade do Gari é muito sofrida, então, há de ter essa valorização,  para que nós possamos, em nossa aposentadoria, ter uma aposentadoria mais digna, se conseguirmos ter um salário digno, através do piso salárial ou insalubridade, então, isso é uma luta diária, e nós com certeza, merecemos essa valorização.

Primeiro quero agradecer, gostaria que você ficasse à vontade para suas considerações finais, agradecimentos, e passar suas Redes Sociais para os seguidores.

Agradeço o espaço, o Blog da Marina, é um prazer muito grande estar aqui compartilhando com vocês um pouco da minha história pessoal, profissional. Então é um motivo de alegria e satisfação, ter espaço como esse no qual a gente pode falar, pode ser ouvido, por pessoas espalhadas pelo Brasil, e também chamar atenção da sociedade, da importância que têm ela, nesse processo de empatia, processo de inclusão também, da gente ter um olhar mais humano, mais atento para tantas profissões, hoje estamos falando do Gari, mas todas as profissões hoje, por causa da pandemia, se tornaram visíveis, reconheceu a importância que têm cada pessoa, desde o Médico, Enfermeiro, Gari, Zelador, Motorista, enfim. Momento de união é momento da gente abrir os olhos e enxergar as pessoas com olhar mais humano, mais atento, porque somos todos iguais, exercemos funções de maior ou menor prestígio social, mas cada uma delas tem a sua importância. Então isso que é importante, a gente refletir essas questões que possam fazer com que a gente conviva e enxergue as pessoas com esse olhar mais humano, então agradeço mais uma vez, essa oportunidade de estar aqui contando a minha história, que Deus nos abençoe, então isso ai, me acompanhe pelas redes sociais @deninhogari , lá vocês vão poder conhecer um pouco do meu dia a dia, do meu cotidiano, meu trabalho, minhas bandeiras e minhas lutas, um abraço e fiquem todos com Deus!


Entrevistado/ Deninho

Repórter/ Marina Sousa

João Pessoa 15-03-2021

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